terça-feira, 27 de maio de 2014

você não é



tire-me daqui, não posso mais, não suporto essa endrômina
tudo aqui é feito de plástico, criação para o ludíbrio
em segundos se desfaz, em tempo menor ao de uma cagada
me tira daqui, não quero isso, nem aquilo
a cada dia que passa, passo a dar menos importância
ao que todos julgam importante
e quem julga?
você se cansa, você sofre, você corre atrás, de quê?
você parece tão infeliz, mas sempre finge tão bem
está tão exausto e não consegue mais dormir
são as vestes de estilo, o carro novo made in Japan, a linda casa decorada, seu cachorro com cheiro bom
você abarrota o tempo com tantas coisas
você mata o tempo, você se mata
você tenta, você tenta, você não vive
você não passa de uma invenção, criou sua imagem e agora investe tempo em alimentá-la
se esforça para o mundo acreditar no que quer que ele acredite sobre você
sua ilusão é tão inconsciente quanto a sua respiração
você é tão doce, por que insiste em ser amargo?
qual das faces sobreviverá, a que julgas ser ou a que pensam sobre você?
eu não me importo mais, eu não quero, e nunca quis
me tira do seu retrato, eu jamais estive lá
eu sou apenas um inseto que escapou do escuro da noite
a mariposa que buscou a luz que me encontrou
essa foi minha última dor de cabeça dos últimos tempos
vou cagar essa farsa, acabar com essa dor de barriga
vou cagar pra você que finge, que pensa que acha que é
você não é
vá cagá!

domingo, 11 de maio de 2014

o inextricável

foto by V - Exposição Mr. Brainwash - Galeria Artes - Londres

tudo pode, e algumas coisas até devem, ser esquecidas, dispensadas - pra fôra da despensa íntima! 
novas etapas virão, novos começos se anunciam, e a gente vai junto, não fica pra trás, não dá, a vida é um processo e as fases vão se cumprir e te empurrar, queira você ou não
e você não vai se matar por isso, nem por aquilo
sinto muito quando coisas que pareciam boas não se eternizam, sempre há esse desejo, por óbvio, mas se chegam ao fim é porque nunca foram, e não eram mesmo pra ser
precedentemente havia um cansaço, ele chegou, ficou, ficou, e ficou, atormentou, e venceu, ele já previa, por isso insistia
a estrada cansa nos momentos que tudo se mostra igual, sem novidade, sem cor, ou a mesma cor, sem tesão, sem paixão, o continuísmo do tudo sempre invariável
o que cansa na verdade não é a estrada, nem o corpo, é a mente, a cabeça...
quando estou correndo, canso, e penso, deve ser a paisagem, que não muda - árvores, árvore, arbusto, rio, grama, flores, florzinhas, carro, carros, bicicletas, motocicletas, gente, pessoas, jovens, velhos, crianças, cães, cadelas - as mesmas circunstâncias em continuidade
então fecho os olhos e corro às cegas, pra ver outros cenários, situações, ocasiões, e aí me vem um ânimo, ganho fôlego, e corro mais rápido, sinto os olhares caírem sobre mim, percebo-os reprovando-me: ''ela corre de olhos fechados, será que é cega (?), uma hora abalroa um objeto inanimado ou animado"
mas, como me resta um cadinho de fé, incitando a mudar o rumo, vou, às vezes com pressa, às vezes às cegas, outras vezes bem lenta, no meu ritmo, mas vou, mudando a direção
porque não há nada mais revigorante que uma nova velha invenção, uma re-criação, a providência da imaginação, ou um sentimento bom pra dar aquele up, aquele gás, aquela vontade de fazer o novo, conseguir, e chegar ao podium de partida 
pode ser que eu não vença, mas estou pronta pra mais uma
e aquela dor passada vai passar, eu sei, sempre passa, as minhas sempre passaram, elas não me abatem e não têm força para subsistir ou submeter-me, o sofrimento eu escolho, se aliso ou chuto
saudade não tem fim, uma hora ou outra vem à tona, como doença crônica, pelo menos não dói por muito tempo, nem mata, pode sentir à vontade, eu garanto, não vai doer
imaginação é potencial-mente-real, é quase mágica, faz presente o que está ausente, traz odores, faz ver coisas, sente gostos e texturas
pode tudo acontecer se é o que você quer, nem que seja só pra você, no seu cineminha íntimo, no fundão solitário da retina, não precisa mais nada e ninguém
uma vez li que o cérebro é o mais importante e potente órgão sexual que existe no corpo humano, então, pronto, basta...pardon pela banal analogia, pois isso aqui nada tem a ver com sexo, embora lamentavelmente quase sempre tudo descambe para o sexo
pessoas, pessoas, gentes de todos mundos, sempre querem despertar desejo ou interesse nos outros...bobagens, devaneios, engodos, vaidades...ah se soubessem...
eu, de minha parte, só quero que me enxerguem como sou, não tenho interesse em despertar sensações, talvez o sentimento de amor, puro, indulgente, fácil, e não por mim, mas pelo outro
sem confusões ou equívocos, por favor, me deixem fora disso
basta eu, basta meu caminho, meu renascimento, chega
não quero mais nada, não quero ter ou precisar, já tenho tudo o que me resta, é o bastante
este é o momento que quero avançar no meu processo, por onde eu vou, o que eu sinto e como sou/estou
foi-se-vou-me-só
c'est tout